
Será a cultura pop um espelho deformador ou um projetor iluminador dos nossos desejos mais íntimos? De facto, o que consumimos nos media molda as nossas percepções da sexualidade, incluindo o BDSM. De facto, é importante notar que vivemos numa época em que o BDSM é mais visível do que nunca, mas muitas vezes matizado com imagens “mainstream”. De um ponto de vista global, a cultura pop democratizou certos aspectos do BDSM. Também criou clichés e obscureceu a complexidade desta comunidade.
Neste artigo, analisamos a influência específica de dois grandes fenómenos – a saga “Fifty Shades” e a estética do látex de Kim Kardashian – no BDSM.
“Cinquenta tons”: o tsunami que abalou os quartos
Antes de mais, é importante lembrar que os livros e os filmes desempenharam um papel importante no sucesso meteórico do BDSM. De facto, ajudaram a colocar a palavra “BDSM” na boca de toda a gente. Os filmes, em particular, têm sido uma porta de entrada para a descoberta, o conhecimento e as ferramentas para compreender o BDSM, mesmo que muitas vezes mal compreendido.
Desta forma, os livros e os filmes ajudaram a desenvolver uma abordagem pessoal ao tema, dando uma antevisão das experiências sexuais e da auto-descoberta. Para além disso, esta popularização do BDSM foi uma surpresa para o público em geral, especialmente para as mulheres.
A “normalização” acentuada de uma prática de nicho
O livro “Fifty Shades” introduziu novos termos como contratos, palavras seguras e a dinâmica da dominação e da submissão gentil para um público mais vasto. O livro inclui passagens eróticas que ilustram o comportamento sexual, o sadismo e a submissão.
A crescente atração pelo BDSM e a descoberta destes temas tem oferecido benefícios educacionais e imaginativos, bem como caminhos para a resolução de certos conflitos pessoais. Esta curiosidade é frequentemente vista como um fenómeno positivo.
As sombras da simplificação e da desinformação
Por outro lado, “Fifty Shades” revelou uma visão diluída e por vezes perigosa do BDSM. De facto, é pintado para confundir com abusos, uma falta de foco no consentimento explícito e contínuo. Para além disso, é um BDSM simplificado, limitado a algemas de pelúcia e cenas sem profundidade, longe da verdadeira riqueza emocional e psicológica desta prática. Para além disso, por detrás de toda esta representação, podemos ver uma comercialização excessiva que só tem servido para banalizar os vários conceitos de BDSM.
De 2015 até aos dias de hoje, podemos falar do verdadeiro legado de “Cinquenta Tons de Cinza” em termos de imersão no BDSM? De facto, trata-se de uma saga com um impacto duradouro. Continua a ser uma porta de entrada para os principiantes e é agora vista como um ponto de partida ultrapassado. Abriu caminho a representações mais autênticas, não presas a certos clichés.
Kim Kardashian em látex: quando o fetiche se torna alta costura
Kim Kardashian é uma figura-chave na moda e na influência cultural. O seu impacto vai muito além da mera celebridade, moldando tendências, redefinindo cânones de beleza e estabelecendo um novo padrão de influência digital. Além disso, as suas escolhas ousadas de vestuário, incluindo peças de látex justas à pele, têm frequentemente origem no mundo fetichista.
A glamourização do látex e o Fetish-Coded
Kim Kardashian levou o látex de eventos clandestinos para as passadeiras vermelhas, vestindo fatos de látex para ocasiões especiais, chamando a atenção. A sua empresa, Skims, também oferece roupa de látex, aumentando a sua popularidade. Outras personagens famosas, inspiradas por ela, começaram a incorporar o látex no seu estilo, aumentando a sua notoriedade.
Atualmente, o que antes era um nicho tornou-se “moda”. Isto atesta o impacto na perceção visual do BDSM e do fetichismo. Além disso, o fetiche codificado é também a criação de uma estética de poder e de sensualidade exacerbada, diretamente ligada às imagens fetichistas.
Influência nas tendências e na aceitação
A glamourização do látex encorajou um público mais vasto a experimentar materiais ou estilos que anteriormente eram considerados demasiado ousados ou “extremos”. De facto, as fronteiras entre a moda quotidiana e o vestuário fetichista são cada vez mais ténues.
Além disso, estamos a assistir ao aparecimento de marcas tradicionais que oferecem látex ou artigos de inspiração semelhante.
Em 2025: uma tendência duradoura ou uma moda passageira?
A estética inspirada no BDSM tornou-se popular, passando de um estilo marginal a algo apreciado pelo grande público. Atrai a atenção das marcas de luxo e dos eventos de passadeira vermelha. As celebridades e a alta costura adoptaram-na, mostrando uma mudança nas tendências culturais.
Embora tenha sido utilizado durante muito tempo para práticas de BDSM, a utilização do látex como um modo de vestuário convencional aumentou nos últimos anos. Além disso, está a ter um impacto real nas preferências de vestuário dentro da própria comunidade BDSM.
A realidade do BDSM reflectida na cultura pop em 2025
Existe um fosso entre a cultura pop e o BDSM. Por um lado, temos uma visão romantizada e simplificada da cultura pop e, por outro, o verdadeiro BDSM. Este último é caracterizado pela complexidade, comunicação rigorosa e segurança.
Como resultado, a ênfase é colocada na negociação, no consentimento contínuo e entusiástico, e nos limites. Entre outras coisas, estes são conceitos raramente enfatizados na cultura pop. A exposição trouxe muitos benefícios, incluindo menos estigmatização, mais curiosidade e a abertura de discussões.
Rumo a uma compreensão mais matizada?
Em 2025, as discussões em torno do BDSM estão mais informadas graças à cultura pop, ou apesar dela. Isto graças às comunidades online e aos educadores sexuais que corrigem os erros e fornecem informações exactas. Na verdade, trata-se de espaços de apoio e de partilha de experiências que, com o contributo de educadores, contribuem com os seus conhecimentos e experiência para garantir a qualidade e a fiabilidade da informação.
Em suma, a cultura pop é uma faca de dois gumes para o BDSM. Porque ao mesmo tempo que trouxe uma visibilidade sem precedentes, também trouxe simplificações que precisam de ser decifradas. Entretanto, o BDSM continua a interagir com a cultura popular, mas a compreensão autêntica continua a exigir educação, comunicação e respeito pelas práticas.